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São idéias e ações imperceptíveis – e não projetos arrogantes – que criam prosperidade
mudar o mundo

Mudar o Mundo…

Recentemente, na academia de ginástica, ouvi uma conversa entre duas mulheres, cada uma já perto dos cinquenta anos de idade. O assunto era a filha de uma delas, que havia acabado de entrar na faculdade.Mulher #1 (falando para a mulher cuja filha entrou na faculdade): “Qual curso ela está fazendo?”

Mulher #2: “Ciências políticas. Com o tempo, ela quer se candidatar a algum cargo público. Ele vive me dizendo ‘Mãe, quero mudar o mundo!’ E ela realmente fala a sério. Ela trabalhou voluntariamente para as campanhas de Hillary Clinton e Bernie Sanders”.

Mulher #1: “Mas isso é ótimo! Você deve estar muito orgulhosa!”

Mulher #2: “Estou sim!”

…..

Não fosse eu um modelo de polidez e temperança, teria abordado a Mulher #2 e dito: “Senhora, não pude deixar de ouvir sua conversa.  Tenho apenas um pedido: por favor, diga a sua filha para ir cuidar da própria vida. O mundo não precisa do tipo de mudança que políticos, tanto os atuais quanto os aspirantes, querem impor.”

Essa ideia de “mudar o mundo” é, na melhor das hipóteses, juvenil e imatura. Na pior, é completamente perigosa.

Repare: há séculos as pessoas vêm querendo “criar um mundo melhor”.

Revolução Francesa visava a um “mundo melhor”. Em três meses, matou mais gente que a Inquisição espanhola matou em quatro séculos.

Para corrigir os “vícios burgueses” da Revolução Francesa, criou-se o socialismo internacionalista, também para melhorar o mundo. Matou 170 milhões de pessoas.

Em seguida, tentaram o socialismo nacionalista (nazismo), também para melhorar o mundo. Mais 6 milhões de mortos.

Recentemente, inventaram o bolivarianismo, também para melhorar o mundo. A comida e o papel higiênico acabaram, cachorros, pombas e animais de zoológico viraram alimentos, vacas eram mortas a pedradas, e crianças e bebês se desmancharam em ossos.

Com este histórico, a pergunta inevitável é: quando é que as pessoas irão, finalmente, parar de querer “um mundo melhor”?

Nenhuma mudança benéfica pode ser alcançada por políticas de engenharia social implantadas por políticos e por outros burocratas do governo.

Sim, tenho certeza de que há muita coisa no mundo que poderia ser mudada para melhor. Mas estou igualmente certo de que nenhuma mudança benéfica será alcançada por políticas de engenharia social implantadas por políticos e por outros burocratas do governo.

O mundo muda para melhor por meio de pequenos gestos imperceptíveis, e não por meio de arranjos anti-naturais e arrogantes. O mundo muda para melhor gradualmente, pouco a pouco, e de maneira experimental. Nada é planejado. Não existe um comitê planejando centralizadamente a construção de um mundo melhor.

João abre um novo restaurante para concorrer com o restaurante já estabelecido de Paulo, e os consumidores — gastando voluntariamente seu próprio dinheiro — é que irão decidir, em última instância, qual dos dois continuará operando. Ou se ambos continuarão funcionando. Ou se ambos irão à falência. Essa concorrência muda o mundo de uma maneira quase insignificante: as opções de restaurante naquela cidade são aprimoradas.

Guilherme abandona seu vício em álcool, volta ao mercado de trabalho e se especializa em uma profissão. Ele consegue um emprego como eletricista ou mecânico, e se torna bem sucedido. Ele melhora o mundo.

Ricardo inventa um novo aplicativo de celular para ajudar os ornitólogos e os observadores de pássaros a se manterem atualizados sobre locais interessantes nos quais há belos pássaros. Essa criação, também, muda o mundo.

Mudança silenciosa ou mudança para pior

Com raras exceções, cada evento que de fato melhora o mundo é pequeno demais para ser detectado nas estatísticas. Ele não é suficientemente digno de nota para lançar o nome do seu efetuador nas manchetes de jornais. É apenas um entre milhões de aprimoramentos que ocorrem diariamente. Cada um deles é ínfimo, mas a soma de todos eles se transforma em uma mudança notável ao longo do tempo.

Aquelas pessoas que querem “mudar o mundo” raramente param para pensar sobre exatamente qual aspecto do mundo precisa ser mudado. Afinal, boa parte de tudo que existe no mundo atual é realmente muito bom, e não deve ficar à mercê dos embustes de qualquer “agente da mudança”.

Pior: as pessoas que querem mudar o mundo têm em mente esquemas que envolvem forçar os outros a se comportarem de uma maneira distinta daquela como se comportariam espontaneamente.

Nosso mundo mudou, maciçamente para melhor, ao longo dos últimos dois ou três séculos. E praticamente todas essas mudanças vieram em doses tão pequenas, que os nomes daqueles que efetuaram cada mudança benéfica jamais se tornaram amplamente conhecidos, e foram hoje perdidos para sempre na névoa espessa da história.

Aqueles “agentes da mudança” — embora não todos — cujos nomes são hoje muito conhecidos foram ou verdadeiros açougueiros humanos — como Hitler, Stálin, Mao Tsé-Tung — ou arrogantes ‘homens do sistema’ — como Franklin Roosevelt e Clement Atlee (ou Lula, Getulio Vargas e Ernesto Geisel) — que oneraram terceiros impondo a eles fardos e restrições contraproducentes, ainda que as destruições trazidas por essas medidas sejam ainda hoje amplamente negadas.

Gotas em uma piscina

A prosperidade material humana é como se fosse toda a água de uma enorme piscina. Quanto maior o nível da água, maior a nossa prosperidade. O nível da água seria o “nível de prosperidade”.

E como essa piscina é enchida? Gota a gota.

Inúmeras pessoas — empreendedores, inventores, cientistas, financiadores, investidores etc. — se aglomeram em torno da piscina, cada uma delas contribuindo com uma gota ou duas de “água” adicional — a prosperidade adicional — de tempos em tempos. Cada uma dessas gotas possui um efeito praticamente imperceptível sobre o nível da prosperidade.

Coisas como novas cores de tinta para as casas, aparelhos de som de melhor de qualidade, novos aplicativos de smartphone, técnicas aprimoradas para alimentos congelados, lâmpadas mais duradouras, novas técnicas culinárias, máquinas de costura mais eficientes, ferramentas que facilitam a abertura de garrafas de vinho, aplicativos de transporte ou de delivery — a lista é praticamente infinita.

Tudo isso gerou um mundo melhor. Tudo isso passou quase que imperceptível quando surgiu. E nada disso foi criado por um comitê que queria criar um mundo melhor.

Algumas pouquíssimas gotas são realmente grandes — por exemplo, a vacina contra a paralisia infantil e a inovação de Henry Ford nas técnicas de montagem de automóveis. Mas praticamente todas as gotas são ínfimas. Essas ínfimas gotas, no entanto, resultam conjuntamente em um incrivelmente alto nível de prosperidade material.

No entanto, os “agentes do mundo melhor” são impacientes. Eles querem mudar o mundo agora, para já! Querem que o nível de prosperidade seja aumentado de maneira repentina e de forma explícita, por meio de uma infusão gigantesca.

Só que, como cada um de nós individualmente, mesmo as grandes corporações, somos ínfimos em relação ao todo, nenhum de nós pode realmente ter a esperança de elevar o nível da prosperidade de maneira imediatamente notável. Consequentemente, os “agentes do mundo melhor” acreditam que não basta “mudar o mundo” contribuindo com pequenas gotas; arrogantemente, querem fazer uma grande esguichada na piscina — uma medida que aumente o nível de prosperidade de maneira imediata e notável.

Ato contínuo, o que eles fazem? Os mais brandos recorrem ao governo, aquela instituição que supostamente pode fazer uma grande esguichada. Os mais radicais inventam modos de produção heterodoxos e anti-naturais, como comunismo, socialismo, fascismo e nazismo.

Para fazer uma grande esguichada, o governo tenta jogar baldes de água na piscina da prosperidade. Infelizmente, dado que burocratas não são guiados por sinais de mercado, dado que eles desconhecem o sistema de lucros e prejuízos, considerando todos os problemas já explicados pela Teoria da Escolha Pública, e considerando que a natureza da prosperidade do mercado é crescer descentralizadamente e de maneira gradual, as grandes infusões que o governo faz são o resultado de galões vazios burocraticamente jogados na piscina.

Esses galões de fato geram uma estrepitosa pancada na água da piscina. Eles frequentemente alteram o nível da prosperidade da piscina — para baixo.

Afinal, pancadas fortes na água da piscina geralmente fazem com que boa parte da água vá para fora da piscina, de onde ela evapora.

E mesmo se o nível mensurado de prosperidade da piscina for maior após o lançamento do galão, esse maior nível se deve ao fato de que agora há um enorme galão na piscina, o qual desloca um equivalente volume de água, dando a impressão de que há mais água na piscina. Mas não há. O real volume de prosperidade é menor.

Pura arrogância

A conclusão é que tentativas de “mudar o mundo” como um todo — mudá-lo de uma maneira que seja perceptível e identificável a uma ação ou a um conjunto de ações — são o ápice da arrogância. Nenhuma mudança, não importa quão bem intencionado seja o agente da mudança, será para melhor.

Esforços benéficos para mudar o mundo quase sempre são sempre pequenos, graduais, e efetuados naquele setor voluntário da sociedade — nas transações comerciais voluntárias (mercado), nas famílias, na sociedade civil. Não ocorre nem dentro do governo nem por meio do governo.

As mudanças benéficas ocorrem ao se acrescentar pequenas gotas à piscina da prosperidade. E não ao se dar grandes pancadas na água da piscina.

Considerando todo o histórico, é fato que o mundo, bem como a história da humanidade, estaria muito melhor se não houvesse tantos intelectuais e ativistas tentando melhorá-lo.

Disponível em Mises Brasil: Por Donald Boudreaux – 11/06/2021 – https://bit.ly/3vrSwbH

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