Quando um produto é lançado no mercado, é de interesse de seu idealizador que se torne um sucesso em vendas. Para se atingir esse objetivo, as organizações despendem recursos para que seja traçada a melhor estratégia de divulgação, de modo a despertar o interesse do público sobre o produto antes mesmo da sua disponibilização.
Nesse contexto, o marketing e a publicidade são ferramentas essenciais para estabelecer um elo entre o produto e o público-alvo, o que envolve táticas visando a atração, fidelização, conversão e conquista do possível consumidor. Por outro lado, cabe ao consumidor identificar os produtos que atendem as suas necessidades e decidir pela compra ou não, com base no seu próprio juízo. Desse modo, se o produto agradar o consumidor, há boas chances de o comprar; caso contrário, provavelmente não o comprará e seguirá em busca de algo diferente que satisfará seu desejo ou necessidade. Pode parecer algo fundamentalmente óbvio, mas não é para todos.
Isso porque, por diversas razões, os consumidores revelam uma tendência em abdicar a responsabilidade por suas escolhas e atribuir a terceiros a culpa por uma decisão pessoal que se revelou equivocada. Com isso, recorrem ao Estado, para que, por meio de seus órgãos fiscalizadores, adote providências contra quem supostamente os teria prejudicado.
O caso dos “Novos MCPicanha” ilustra com perfeição esse tipo de comportamento dos consumidores. Na última semana do mês de abril de 2022, o anúncio da nova linha de sanduíches do MCDonald’s tomou conta das manchetes dos principais jornais do país após uma onda de acusações de prática de propaganda enganosa ter sido deflagrada nas redes sociais.
A discussão teve origem em uma publicação de um perfil no Instagram que alegava que a carne do sanduíche divulgado não era picanha. A grande repercussão da acusação acabou por atrair a intervenção do Estado, pois, no dia seguinte, o McDonald’s recebeu notificações do Ministério da Justiça e do Procon-SP, além de entrar na mira do Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar) e do Ministério Público.
Todo esse movimento fez com que a empresa emitisse a seguinte nota oficial: “A partir desta sexta-feira (29), estamos retirando do cardápio os dois sanduíches da linha ‘Novos McPicanha’, em todos os restaurantes no país. Esclarecemos que a plataforma recém-lançada denominada ‘Novos McPicanha’ teve esse nome justamente para proporcionar uma nova experiência ao consumidor com o exclusivo molho sabor picanha, uma nova apresentação e um hambúrguer diferente em composição e em tamanho (100% carne bovina, produzida com um blend de cortes selecionados e no maior tamanho oferecido pela rede atualmente). Pedimos desculpas se o nome escolhido gerou dúvidas e informamos que estamos avaliando os próximos passos.”
Ao analisar a arte de promoção do MCPicanha, é possível identificar alguns informes escritos em letras minúsculas e, em particular, a informação essencial de que o produto utiliza “hambúrguer 100% bovino com molho sabor picanha”. Aqueles que leram isso certamente estavam conscientes de que o hambúrguer não era feito a partir da carne da picanha, mas sim que o molho aplicado era sabor picanha. Por outro lado, aqueles que não se dispuseram a ler os informes ou simplesmente questionar o atendente antes da compra assumiram um risco, pois optaram por adquirir um alimento sem se aprofundar nos detalhes de sua composição.
A despeito da clareza da mensagem, a verdade é que o McDonald’s se viu obrigado a um pedido de desculpas devido à pressão oriunda das redes sociais, justamente por causa de consumidores que não apenas se negam a assumir a responsabilidade por suas escolhas, como ainda (em decorrência dessa abdicação) exigem ou corroboram a intervenção do Estado nas relações comerciais. O resultado disso? A redução da liberdade econômica das empresas, que se veem diante da necessidade de adotar medidas que, não raro, lhes causam prejuízos financeiros e, ainda, prejudicam os próprios consumidores. Nesse caso específico, desde o dia 29/04/2022, o McDonalds não vende mais o MCPicanha, que era considerado a grande aposta de vendas para o ano de 2022, de modo que aqueles que desejavam consumir um sanduíche com molho sabor picanha não mais o poderão fazer.
Infelizmente, não se trata de um episódio isolado. Em 2010, algo semelhante aconteceu com a Nestlé, quando a Anvisa proibiu o anúncio do produto “Alpino Fast”, pois a bebida não era feita à base do famoso chocolate Alpino . Mais recentemente, o alvo da vez se tornou o Burguer King, que admitiu que seu famoso lanche “Whopper Costela” apenas contém aroma natural de costela suína e não traz hambúrguer produzido com carne suína . Percebam que, em todos esses casos, a reação de consumidores que não buscam informações sobre os produtos que consomem invariavelmente atrai e ratifica a intervenção do Estado, que, em última instância, decide o que pode ser comercializado. Em outras palavras, o que se verifica é que, sob a justificativa de proteger os consumidores, o Estado retira a liberdade dos próprios consumidores de decidir o que adquirir.
A pergunta que fica é: até quando os consumidores conscientes estarão à mercê da intervenção do Estado nas relações de consumo? Na visão do consumidor que prefere não se responsabilizar por escolhas ruins, é mais “atraente” esperar que o Estado defina culpados e determine o que pode ou não ser feito pelas empresas. Nesse cenário, o consumidor pode acreditar que o Estado apenas protege os seus direitos ou que eventual prejuízo para a empresa é irrelevante. Todavia, o que esse consumidor não leva em consideração é que, ao exigir a intervenção do Estado nas relações de consumo, cada vez mais se oferece espaço e poder para o Estado ditar como as atividades econômicas devem ser exercidas.
Portanto, diante de casos como o do MCPicanha, devemos ter sempre em mente o ensinamento do economista Friedrich Hayek, para quem “liberdade significa não somente que o indivíduo tenha tanto a oportunidade quanto o fardo da escolha; significa também que ele deve arcar com as consequências de suas ações”.