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Ame ou odeie muito tudo isso: a história da McDonald’s é uma grande lição de empreendedorismo
Como Ray Kroc construiu um império a partir de uma constatação atípica

O filme Fome de Poder (The Founder, 2016), baseado na vida de Ray Kroc, ilustra de maneira vívida pontos cruciais sobre empreendedorismo e mercado, os quais sempre foram ressaltados por Ludwig von Mises.

Primeiro, confira o trailer.

No filme, Kroc, interpretado pelo sempre excelente Michael Keaton, começa sua vida profissional como um mero vendedor de máquinas de milkshake.

Um determinado dia, ele conhece os irmãos McDonald, proprietários de um pequeno restaurante em San Bernardino, Califórnia. Kroc resolveu ir a este restaurante para conhecer os proprietários, pois eles — os irmãos Dick e Mac — haviam comprado seis de suas máquinas.

Ao chegar ao local, Kroc descobre um empreendimento pujante. Os irmãos vendem hambúrgueres completos a custos extremamente baixos. Mais ainda: os hambúrgueres ficam prontos em poucos minutos. No entanto, não há absolutamente nenhum talher e nenhum prato à disposição no restaurante. Em vez disso, os clientes recebem seus sanduíches embalados num papel.

Kroc imediatamente percebe que há uma grande oportunidade de lucro caso este empreendimento se torne uma franquia.

(Como o leitor deve saber, franquia nada mais é do que um arranjo que envolve a venda de licenças. Neste arranjo, o franqueador (o detentor da marca) cede ao franqueado (o autorizado a explorar a marca) o direito de uso da sua marca, patente, infraestrutura, know-how e direito de distribuição exclusiva de produtos ou serviços. O franqueado, por sua vez, investe e trabalha na franquia e paga parte do faturamento ao franqueador sob a forma de royalties.)

A ideia da franquia já havia ocorrido aos irmãos, mas eles não haviam conseguido levá-la a cabo de maneira lucrativa.

Após uma conversa, os irmãos McDonald chegam a um acordo com Kroc: ele irá cuidar de todo o processo de franqueamento.

De início, há uma séria de inevitáveis contratempos e decepções. As receitas de Kroc são baixas e a fatia do lucro que fica com ele é ínfima. Ele tenta renegociar o acordo com os irmãos McDonald para tentar elevar sua fatia do lucro, mas os irmãos recusam. O aluguel dos imóveis onde operam os restaurantes franqueados é alto e Kroc começa a ficar inadimplente. Ele recebe várias notificações e ameaças de despejo. Para se manter operante, Kroc chega a pedir um empréstimo bancário dando a própria casa como garantia, o que o coloca em conflito com sua mulher.

E então ocorre a grande virada: um consultor financeiro diz a Kroc que o segredo para o sucesso neste ramo é, em vez de pagar aluguel, ser o proprietário da terra na qual a franquia opera. Em outras palavras, o consultor ensina a Kroc que, antes de ser um franqueado, ele tem de ser um agente imobiliário.

Eis a explicação: a escolha entre alugar um imóvel ou comprar um lote de terra para então construir seu estabelecimento comercial vai depender inteiramente da sua avaliação de risco. Uma franquia como a McDonald’s só é lucrativa se suas operações forem de baixo custo. Sendo assim, pagar aluguel em áreas nobres seria inviável. Consequentemente, a única maneira de operar lucrativamente seria comprando terrenos em áreas relativamente inexploradas, pouco habitadas e baratas, e então construir seus restaurantes.

Isso não apenas livraria o franqueado de aumentos contínuos no preço do aluguel sempre que o terreno se valorizasse, como ainda o livraria do risco de o proprietário do imóvel decidir não renovar o contrato para construir no local empreendimentos de maior rentabilidade.

Após esta dica, Kroc faz exatamente o que foi sugerido: ele abre uma empresa de corretagem de imóveis e, a partir daí, sua assombrosa energia faz todo o resto. Franquias começar a ser construídas em todo o país. Após muita persistência, a ideia começa a se comprovar incrivelmente bem-sucedida.

Infelizmente, Kroc está longe de ser um bastião de virtude. Ávido por fazer as coisas à sua maneira, ele desobedece seu combinado com os irmãos McDonald, pressionando-os a vender para ele sua participação no empreendimento e revogando seu acordo (feito apenas oralmente, sem contrato assinado) de pagar royalties. Sob o novo arranjo, os irmãos não podem usar o nome “McDonald’s” em seu próprio restaurante em San Bernardino.

Kroc, em seguida, abre uma franquia McDonald’s em frente ao restaurante dos irmãos — o qual, incapaz de concorrer com o modelo mais eficiente e barato adotado por Kroc, acaba fechando.

O sucesso da McDonald’s ilustra um ponto que sempre foi repetidamente enfatizado por Mises. O capitalismo é um sistema de produção em massa para as massas. O mercado sempre irá fornecer aquilo que os consumidores demandam, desde que isso possa ser feito lucrativamente. Como explicou Mises:

Os consumidores e sua decisão de consumir ou de se abster de consumir determinam o que deve ser produzido, em qual quantidade, e com que qualidade. Ao consumirem aquilo que mais lhe convém, eles determinam quais empresas obtêm lucros e quais sofrem prejuízos.

Aquelas que lucram expandem suas atividades e aquelas que sofrem prejuízos contraem suas atividades.

Desta forma, as massas, na condição de consumidores no mercado, estão continuamente retirando o controle dos fatores de produção das mãos dos empreendedores menos capazes e transferindo-o para as mãos daqueles empreendedores que são mais bem sucedidos em satisfazer seus desejos.

Sob o capitalismo, a propriedade privada dos fatores de produção por si só representa uma função social. Os empreendedores, os capitalistas e os proprietários de terras são os mandatários, por assim dizer, dos consumidores, e seus mandatos são plenamente revogáveis. Em um mercado livre e desimpedido, no qual não há regulamentações, subsídios ou protecionismos estatais, para um indivíduo ser rico, não basta ele ter poupado e acumulado capital. É necessário que ele invista, contínua e repetidamente, naquelas linhas de produção que melhor atendam aos desejos dos consumidores.

O processo de mercado torna-se um plebiscito que é repetido diariamente, e que inevitavelmente expulsa da categoria dos eficazes e rentáveis aquelas pessoas que não empregam sua propriedade de acordo com as ordens dadas pelo público.

É improvável que a McDonald’s ganhe alguma estrela do guia Michelin; porém, para o mercado, isto é irrelevante. Empreendimentos de sucesso são aqueles que satisfazem as verdadeiras preferências dos consumidores, e não aqueles que se preocupam apenas com critérios externos e específicos.

No entanto, apenas ter uma ideia que agrade aos consumidores não é o bastante. As receitas de venda têm de superar os custos; e uma alta demanda, por si só, não é o suficiente para fazer com que um produto seja lucrativo. Foi apenas quando Kroc percebeu a importância de se tornar proprietário das terras na qual a franquia opera — e as terras tinham de ser compradas a baixo preço, em terrenos pouco valorizados — que ele foi capaz de alcançar um sucesso espetacular.

Isso mostra que o empreendedor de sucesso é aquele que é capaz de estimar as receitas futuras, bem como os custos de produção, de maneia mais acurada que seus concorrentes.

Como observou Mises, “O empreendedor é, na realidade, é um especulador, alguém que possui uma estimativa quanto às futuras condições do mercado e está ávido para realizar empreendimentos que, caso antecipem corretamente as futuras demandas dos consumidores, irão resultar em lucros. […] O que distingue o empreendedor bem-sucedido das outras pessoas é precisamente o fato de ele não se deixar levar pelo que foi ou pelo que é, mas de agir em função da sua opinião sobre o que será. Ele vê o passado e o presente como as outras pessoas; mas sua visão do futuro é diferente. Suas ações são dirigidas por uma estimativa do futuro que não é a mesma da maioria das pessoas.”

À primeira vista, a ideia de ser proprietário das terras nas quais o estabelecimento opera soa menos criativa do que a própria noção de fast food. No entanto, e mais uma vez, isso é irrelevante do ponto de vista do mercado. Foi apenas quando a primeira ideia foi colocada em prática, que todo o empreendimento deslanchou. Foi essa ideia o que realmente permitiu que o fast food se tornasse um empreendimento lucrativo e de produção em massa.

E foi Ray Kroc, e não os irmãos McDonald, quem percebeu isso. E foi ele quem de fato correu todos os riscos e se mostrou capaz de conseguir todo o financiamento para que sua enorme, ousada e totalmente inovadora empreitada seguisse em frente.

Disponível em Instituto Mises Brasil: https://bit.ly/3kSgDgN

 

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